O ódio a corpos Femininos não-Feminilizados no contexto do Neoliberalismo Sexual contemporâneo

Memória Lésbica
25 min readJun 5, 2021

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Por Laila Maria (SapaGanja) e Jan (Memória Lésbica)

“Nós ousamos sermos sapatonas. Este é o nosso crime contra a humanidade. Nós ousamos amar outras sapatonas. Isso é imperdoável no patriarcado. Mas nós não paramos. Nós queremos o melhor mundo possível para lésbicas e para todas as fêmeas, e isso também significa um mundo não poluído, selvagem, seguro para as outras criaturas na terra”

Bev Jo, em Dykes Loving Dykes (1990)

Emma Portner e Elliot Page no momento Ellen Page, quando ainda lésbica assumida.

Eu Laila Maria enquanto mulher negra, maconheira e sapatão e uma das redatoras deste artigo, possuo em minha existência política marcadores sociais que me destacam positiva e negativamente dentro do projeto político patriarcal em que vivemos. Por exemplo, a positividade está em me orgulhar de ser do jeito que sou, e a negatividade está no racismo, na criminalização e na disforia corporal que cotidianamente a sociedade emprega contra mim, afinal de contas, se mulheres geralmente já são odiadas, as que não performam feminilidade ainda mais.

Os recentes acontecimentos com Elliot Page e Billie Eilish provaram que uma mulher que não performa feminilidade não é aceita na sociedade atual, restando a ela apenas duas opções:

1- Ceder a performance do papel sexual feminino (Exemplo Billie Elish) ou
2- Rejeitar o ser mulher e transicionar por meios hormonais e cirúrgicos para a leitura social como um homem, ambas únicas estratégias de sobrevivência para mulheres atualmente no Patriarcado em sua expressão neoliberal.

Em ambas as opções nota-se o ódio com o qual são tratados corpos e mentes que não compactuam com o molde feminino social. Neste ambiente, o ódio a mulheres lésbicas e o que sua existência significa se intensificam, sendo essa a consequência de não escolher nenhuma das duas opções fornecidas pela sociedade.

Luana Barbosa dos Reis, mulher desfeminilizada morta em abordagem policial. Fonte: Geledés

O ódio a corpos femininos não-feminilizados mata, principalmente mulheres negras e marginalizadas. Luana Barbosa é um exemplo de como a margem sofre com um sobretom ainda mais cruel quando não compactua com as diretrizes sociais patriarcais. Luana, mulher negra, mãe e caminhão, em uma abordagem da polícia, foi rechaçada por ser mulher e não performar feminilidade e, ao se recusar a ser revistada por um policial homem (direito que toda mulher tem prescrito por lei) o peso da hierarquia racista fez com que o resultado do ódio ao corpo negro não-feminilizado desta mulher fosse morte por espancamento. Eram três homens, humilhando, xingando e espancando uma mulher mãe, negra, butch e periférica que além de exigir um direito prescrito por lei, possuía uma existência que é digna e exige respeito.

Dentro de uma sociedade que odeia mulheres e que busca a extinção de mulheres lésbicas de forma física e simbólica, o que aconteceu com Luana Barbosa é o que acontece com a maioria das mulheres que não performam feminilidade e não aceitam se enquadrarem nas opções pós-moderna de conformidade patriarcal: transgenerismo ou falso empoderamento da feminilidade/pornificação. Opções que a sociedade dá enquanto “resolução” de um problema que só existe para os patriarcas incomodados. Morte por espancamento e estupro corretivo são coisas as quais estamos constantemente correndo risco, principalmente lésbicas não-feminilizadas negras, periféricas e do campo, por desobedecermos as expectativas heterossexistas.

A transição de gênero neste contexto se torna uma tentativa desesperada de escapar à eliminação destes corpos ameaçadores à ordem heteropatriarcal. Porém, a transição das corpas femininas não constrói um futuro para nossas existências rebeldes à feminilização, onde nossas corpas que se reivindicam humanas e não bonecas infláveis de homens, possam existir em paz.

A mensagem de tais violências é de que se “parecemos com homens”, se “queremos ser homens”, formas como a sociedade julga a existência feminina que rejeita o estereótipo sexista (gênero), e se concomitantemente não renegamos nosso sexo, portanto, precisamos morrer. São os lesbocídios, assassinatos motivados por lesboódio, é o perecimento lento por marginalização econômica e de saúde, são transtornos mentais e suicídio que afetam lésbicas. E é o apagamento que consiste na extinção simbólica, na impossibilidade de menção das nossas vidas, de gritarmos o que somos: lésbica, sapatão, caminhoneira, com orgulho, uma vez que nossos nomes estão “caindo de moda” ou sendo criminalizados como sempre. Isso volta a nos invisibilizar e tornar nossas vidas inexistentes e impronunciáveis, sem direito a memória e registro na história.

E ao final somos sempre culpadas da violência que “buscamos” com nossa apresentação insubmissa. Pois “provocamos”, dizem eles, a ira dos patriarcas, com nossa escolha em amar mulheres e principalmente: não amar homens.

Dentro de um contexto onde o regime de gênero é compulsório para mulheres, a transição não é escolha, a prostituição não é escolha, a maternidade não é escolha, a heterossexualidade não é escolha. São todas tentativas desesperadas da classe mulher sobreviver e não ser morta, ou marginalizada até o perecimento material. Isso é gênero: violência sexista, e não identidade.

Demi Lovato se assume “não-binárie”. Fonte Revista Quem, Globo.

Muitas mulheres e lésbicas estão optando rejeitar se nomear como mulher ou lésbica, por meio da identidade em voga “não-binárie”, o novo armário chic e pós-moderno. O problema da escolha por se denominar não-binárie, coisa que vemos muitas sapatonas sem conformidade de gênero fazer ultimamente, é que ao invés de se afirmar diante da sociedade como mulher, não-feminilizada, escolhe-se rechaçar o ser mulher e com isso reforçar que mulher está realmente ligado ao papel sexual imposto a estas: o gênero. Portanto, tal tendência reafirma o gênero. Potente seria dissociar o ser mulher do estereótipo heterossexista construído, de forma a promover transformação social num sentido feminista autêntico e originário, e principalmente: para todas. O não-binarismo não acaba com o gênero, ele só declara que eu ou outra pessoa somos especiais, “agraciadas” com o dom de “não temos gênero”, pois “fluímos” (coisa que ao invés de acabar com o gênero, os recicla), deixando o resto das mulheres com o grilhão da feminilidade, maioria obrigadas a performar isso por sobrevivência trabalhista. Não, o gênero é imposto a toda classe das pessoas nascidas no sexo feminino. Ninguém é binário, pois o gênero (papel social por sexo) é uma imposição artificial e sistêmica. Você não vai escapar do gênero por autodenominação individualista, precisamos uma estratégia solidária e coletiva, como fazem as feministas sul-coreanas, onde uma massa crítica feminina se compromete com a des-feminilização, para construir um futuro onde mulheres não sejam dependentes da indústria da beleza ou precisem performar comportamentos de gênero que demarcam a nossa subalternidade.

Feministas sul-coreanas destróem maquiagem em ações puxadas em rede social e em protestos de rua. No movimento “Tire o Espartilho”, mulheres coreanas postam fotos ou fazem vídeos do processo, incentivando mulheres a aderir ao protesto e desertar a feminilidade. Este movimento organizado de boicote conseguiu causar um prejuízo milionário na indústria da beleza no país, chamado de K-Beauty. Em protestos de rua, é comum uma ação onde feministas sul-coreanas cortam o cabelo e raspam a cabeça, em rejeição à feminilidade. Chamam o cabelo comprido de “hijab de proteína”, algo pouco prático que demarca nossa diferenciação sexista e associado ao ser bela e sensual para um homem e admissível em uma entrevista de emprego. Portar uma estética desfeminilizada é uma norma no movimento feminista coreano e toda feminista se compromete nesta ação de boicote.

Nós, mulheres lésbicas, reivindicamos o direito pleno de nossa existência e excluímos as únicas opções absurdas deixadas para nós, que somente apontam a ceder às estratégias patriarcais. As mulheres que não compactuam com tais apagamentos, por exemplo lésbicas butch, caminhoneiras, meninas molecas, se encontram em um limbo emocional, pois, seu corpo, trejeitos, estilo e falas são descredibilizados em meio ao senso comum. Hoje em dia crianças com não-conformidade de gênero precisam lidar com muitos desafios para ter um desenvolvimento emocional e cognitivo saudável, pois são escassos os referentes de liberdade feminina. Diante deste vácuo de representações não-objetificadas de mulheres, e diante da invisibilidade lésbica e de mulheres orgulhosamente divergentes da feminilidade, meninas começam a cogitar a transição cedo e lhes são administrados bloqueadores hormonais da puberdade, cujos efeitos no desenvolvimento bio-psico-social destas sujeitas ainda é desconhecido. Em alguns casos se mostra inclusive trágico, por relatos como os de Keyra Bell, mulher que foi transicionada ainda criança. Ela conseguiu processar a clínica que a deixou com sequelas irreversíveis de saúde na vida adulta.

A intensa propaganda queer que bombardeia adolescentes em redes sociais hoje, somada à pressões sociais, estimulam crianças a ingressar na transição infantil com aquiescência de pais que, ou são heterossexistas, ou que frente a falta de informações, cedem ao alarmismo de médicos e psicólogos comprados pela ideologia transgênero. Isso tudo a despeito da incapacidade de infantes para consentir plenamente nestes procedimentos físicos irreversíveis, dado que sua cognição e juízo ainda estão em formação.

Keyra Bell, mulher lésbica detrans que ganhou ação judicial contra a clínica de transição Tavistock e a fundação Portman NHS. Link para seu relato original em inglês no final do artigo.

Tendo mídias, cultura pop, sociedade, família, escola e educação sexista, brinquedos diferenciados para meninos e meninas, intensos investimentos desde a infância para entrar nos moldes de gênero, e logo após tudo isso, o próprio meio LGBT — hoje mais um mercado que uma comunidade — como carrasco, o açoite vem em sentir o mal-estar político e psíquico do “despertencimento” e da estrangeridade, pois lésbicas habitam um não-lugar radical dentro da ordem patriarcal. Essa pressão social leva muitas mulheres lésbicas a acharem que o correto é passar pelo processo de transição, afinal, de um lado temos uma sociedade que diz:

- Se você se veste e age “como um homem” (na verdade como “humana”, foram homens que tornaram a humanidade uma propriedade exclusiva deles), vai ser tratada com um artigo “O” que nos remete ao ideal de que mulheres tem que ser femininas, ou não são dignas de serem tratadas como mulheres, impossibilitadas de aceder ao status de humanas.

Do outro uma sociedade que diz:

  • Você tem certeza de que não é trans? Com esse seu estilo assim, esse seu jeito né?… já pensou nisso?- Frase que muitas estão escutando hoje em dia, muitas vezes já na infância pois o próprio Hospital das Clínicas em São Paulo realiza procedimentos de transição infantil em crianças fora das normas sexistas.
Dr. Alexandre Saadeh, psiquiatra responsável pelo Ambulatório Transdisciplinar de Identidade de Gênero e Orientação Sexual do Hospital das Clínicas de São Paulo, onde realizam processos de transição em crianças. Foto acima em entrevista no programa da Fátima Bernardes na Globo.

Nada que vem de mulheres é masculino, pois entendemos feminino como aquilo que diz respeito a fêmea humana, e masculino como aquilo que deriva dos homens, enquanto existência humana, social, política, cultural. Lésbicas caminhoneira e sapatonas não somos “masculinas”, somos femininas pois somos mulheres, o que não somos é feminilizadas. Masculinizar simbolicamente a existência de mulheres lésbicas é um projeto político patriarcal e da ideologia queer/generista que o sustenta em sua versão pós-moderna e palatável por círculos progressistas, e cujo intuito é extinguir a existência de mulheres que não seguem as normas sociais patriarcais. A existência deste projeto não se resume somente às violências a que caminhoneiras e mulheres com inconformidade de gênero estão sujeitas, mas também às consequências sociais que esse raciocínio de gênero traz, principalmente no meio “LGBTQIA+”. Aqui vamos chamar a comunidade “LGBTQIA+” de “GBT”, retirando o L do meio destas siglas, pois constatamos que tal movimento não representa lésbicas, sendo o “L” pura tokenização, e queremos denunciar a lesbomisoginia existente no movimento LGBT.

Paulo Gustavo e seu marido Thales Bretas com quem realizaram barriga de aluguel, participando na exploração reprodutiva de mulheres para obter bebês.
25 entidades LGBT no estado espanhol aderiram a manifesto pedindo a regulação da gestação subrogada, vulgo barriga de aluguel e que chamamos de prostituição/exploração reprodutiva.

Homens estão a frente do movimento GBT+. Homens gays embora oprimidos por heterossexismo, possuem um pé no patriarcado pelo pertencimento de classe, e vão defender esses privilégios, portanto não buscarão uma mudança radical e sim uma acomodação melhor no próprio patriarcado. E homens não sofrem com a mesma pressão social que as mulheres: mesmo quando não são “tão masculinos” ainda são e em algumas circunstâncias até mais amados e ovacionados, obtendo mais respaldo social que as mulheres em geral. Basta ver a popularidade, carisma e fama que gozam os homens gays como Pabllo Vittar, ou o infelizmente falecido Paulo Gustavo que recebeu imensas homenagens em várias mídias, mas enquanto vivo não gerou o mesmo debate público necessário sobre o fato dele ter recorrido ao perverso e classista mercado da exploração/prostituição reprodutiva das “barrigas de aluguéis”, indo aos EUA para encontrar mulheres precarizadas que disponibilizam seu útero para abrigar um processo de gestação com todos riscos que implicam, em troca de dinheiro para sobreviverem. Esta é uma bandeira defendida por alguns setores LGBT em países como Espanha e outros. Homens gays constituem um setor social este sim empoderado financeiramente e detentor do Pink Money que alimenta o corporativismo “LGBTQI+”. Hoje as empresas como ITAU, Pepsico, C&A, Boticário e outras portam as cores da bandeira LGBT em produtos e lojas não porque sejam progressistas, mas simplesmente para lucrar por meio do Pink Washing. Por outro lado temos o Capitalismo Pink de homens gays. O pertencimento a classe masculina faz com que diferente de mulheres lésbicas, tenham prestígio econômico.

A fala acima mostra a falta de empatia e misoginia de que são capazes homens gays e o narcisismo masulinista envolvido na barriga de aluguel. Retirado de: https://www.purepeople.com.br/midia/filhos-de-paulo-gustavo-e-thales-bretas_m3514047

Com a neutralização, despolitização dessa forma de enxergar gênero promovida pelo GBT+, a comunidade tem abraçado e até mesmo propagado a autoginefilia, uma condição onde homens tornam a performance de feminilidade um fetiche, enquanto à nós mulheres é compulsória, oprime, constrange e sem a qual não sobrevivemos no mercado laboral.

A “autoginefilia” é um termo cunhado em 1989 por um homem americo-canadense phd em sexologia e que tem reconhecimento mundial por seus estudos com transexuais e homossexuais. Não compactuamos com as teorias deste teórico e muito menos com a desresponsabilização do indivíduo que vem com a patologização, mas tal fenômeno apenas demonstra a normalidade do patriarcado: homens criaram o constructo fetichista da feminilidade, então nada mais óbvio do que eles encarnando tal constructo com fins de excitação sexual de cunho narcisista.

“No momento em que me vi totalmente depilada em frente ao espelho foi emocionante. Foi como me ver pela primeira vez. É mais que prazer, é quase um êxtase. Cheguei a ter uma ereção(…) — Laerte em entrevista a Rolling Stone

Na autoginefilia a figura masculina sente atração, excitação em imaginar-se ou travestir-se como mulher. Segundo a definição original “na autoginefilia, o homem quer ser mulher por causa de um apego erótico à ideia de si mesmo como mulher.” ou “propensão a ser eroticamente excitado pelo pensamento ou imagem de si mesmo como mulher”.

Lendo sobre o assunto, que divide transativistas e feministas radicais, encontrei uma matéria no The Public Discourse escrita por Jane Robbins, uma advogada, escritora e pesquisadora de Atlanta que compactua com a “Tipologia do Transexual”, e questiona o porquê do movimento trans negar a existência da autoginefilia:

  • Os ativistas transgêneros freqüentemente argumentam que os homens que desejam se apresentar como mulheres (homem para mulher ou transgêneros MtF) têm uma “identidade de gênero feminina”, provavelmente inata, que conflitua com seu sexo biológico. Esses homens, eles argumentam, são “mulheres presas em corpos de homens” e, portanto, são candidatos adequados para o chamado “tratamento de redesignação de gênero”: drogas, hormônios e cirurgia que não mudam seu sexo, mas os ajudam a imitar as mulheres na aparência. Este argumento foi considerado a “narrativa da essência feminina “. Coisa que choca com o esforço feminista de anos de ativismo e lutas sociais organizadas de mulheres, de que o estereótipo sexista de feminilidade não nos define, expressada na clássica frase: “O feminismo é a noção radical de que mulheres somos pessoas”, pois nossa luta é para sermos admitidas na categoria humana sem que isso implique em negar ou desvalorizar nossa diferença sexual.
  • A “imitação estética do sexo feminino” dentro do modelo da sua sociedade geralmente se dá por meio de intenso investimento da indústria da beleza que sustenta a feminilidade. Entendemos a feminilidade como artíficio patriarcal que descaracteriza a humanidade das mulheres e tem o propósito de demarcá-las como casta sexual diferenciada.
  • Ativistas transgêneros oferecem essa teoria como um fato científico, muito embora não tenham provas da existência de um cérebro “feminino” ou “masculino”, quando nem a homossexualidade pôde ser explicada como uma tendência inata determinada por genes. Mas a narrativa da essência feminina entra em conflito com outra teoria que explica a disforia de gênero MtF (transexual “macho para fêmea”, tradução literal do inglês). No caso a teoria que Jane Robbins aponta é a autoginefilia, e em sua matéria prossegue:
  • Autogynephilia é distinta da homossexualidade; na verdade, os autoginéfilos freqüentemente interagem sexualmente com mulheres reais, e podem se apresentar como “lésbicas” após a “transição” para a imitação estética do sexo feminino. A característica distintiva é o apego erótico do paciente não a outra pessoa, seja homem ou mulher, mas sim a uma ideia interior — a ideia de si mesmo como uma “mulher”. Entre muitos estudos de caso de sua prática, a teórica descreve pacientes que são sexualmente excitados por funções corporais femininas, como a menstruação. Um exemplo disso é o cartunista Laerte, que diz ter descoberto que era mulher no momento em que teve uma ereção ao vestir um vestido.
  • Devido a que homens heterossexuais não possuem essa pressão sobre si de terem que transicionar para sobreviver nessa sociedade que odeia corpos femininos e lésbicos ou que é homofóbica e heterossexista e não aceita que dois homens possam se amar, é que questionamos o pensamento da Dr.Jane e do teórico Ray Blanchard. Pensamos que o que existe é a excitação masculina em performar o imaginário social do ser mulher. Esse sim, é o verdadeiro motivo de transativistas negarem a autoginefilia, pois a autoginefilia na realidade, exemplifica o que de fato é a base do lobby trans, pois torna visível que o movimento transativista é sobre direitos sexuais masculinos, sendo o clássico a prerrogativa da classe sexual masculina de acesso irrestrito aos corpos e existências geográficas das mulheres.
  • Escondendo a motivação por poder masculino sobre mulheres, por meio da negação de seu pertencimento ao sexo masculino e tudo que deriva da subjetivação masculina (privilégios), ocultam que se tratam de sujeitos homens por trás da estética que emula a feminilidade hegemônica opressora para mulheres.
  • O movimento GBT+ afinal avança uma agenda masculina clássica ligada a prostituição, pornografia, exploração reprodutiva, acesso a corpos femininos e correção das existências lésbicas por meio da imposição fálica. São os direitos sexuais de mulheres sendo tratorados pelo reclamo dos direitos das sexualidades dos homens, e isso se expressa em políticas públicas que em muitos países estão apagando as referências ao sexo biológico com todas especificidades que decorrem dessa anatomia, seja no campo da saúde, no direito à esportes diferenciados por sexo, a banheiros seguros para mulheres e à educação sexual para prevenir o abuso infantil, pois nesta precisamos ensinar crianças a nomear seu sexo e entender seus genitais e aparelho reprodutor potencial para melhor se defender de pedófilos. Isso sem contar o aparelhamento do Estado, que avança legislações como identidade de gênero e serviços de “assistência” a esta população, incluindo a hormonização pelos sistemas públicos de saúde, enquanto fecham centros de referência a mulher vítima de violência e aprovam leis ainda mais restritivas ao aborto em casos previstos anteriormente pela lei. Enquanto tais “direitos” de cunho individualista (cirurgia estética no SUS por exemplo) avançam, a perspectiva de aborto legal e na saúde pública, direito cuja privação mata mulheres anualmente, segue sendo uma miragem distante.
Ao ser questionado acerca do prazer envolvido em se travestir de mulher, Laerte revela: “Olha dá tanto prazer que não dá nem prazer mais. Da tanto prazer e a coisa assim que já virou o meu modo natural de me, de me vestir, de me expressar” (LAERTE, entrevista à CULTURA)

E também vale lembrar que sim, o corporativismo “LGBTQI+” e o pink money são tão fortes e hegemônicos por estarem ligados à indústria do sexo, e por isso o interesse em investir ideologicamente por meio da teoria queer ou generismo para sustentar a nova ordem hegemônica patriarcal ou NeoPatriarcado (Neoliberalismo Sexual). Preferimos chamar de generismo à falar em “Ideologia de Gênero”, por tal conceito estar muito veiculado à direita e ofensivas homofóbicas, e portanto reivindicamos sempre que possível, o conceito de sexo em lugar do conceito de gênero. Desejamos falar um pouco sobre este ambiente cultural de normalização da objetificação dos corpos femininos, pois isto está totalmente relacionado com a epidemia da disforia sexual entre meninas e mulheres.

Quadrinho “Los 3 amigos” desenhado por Angeli, Glauco e Laerte, que fazia humor a partir de estupro, pedofilia e misoginia, gozou de muita popularidade, sendo publicado desde 1991 na seção da Folha para adolescentes a FolhaTeen.

A propagação ideológica do liberalismo sexual é necessária para engendrar o meio cultural de uma sociedade cada vez mais permissiva quanto à exploração sexual e toda pornificação que é tão rentável aos patriarcas, tornando aceitável a indústria do sexo. Hoje vivemos em uma cultura aliciadora onde a hipersexualização precisa ser cada vez mais banalizada e tornada comum para que a prostituição global triunfe no ápice/crise do neoliberalismo capitalista, tornando mais fácil que mulheres sejam recrutadas para enriquecer exploradores sexuais por sobrevivência financeira. Um exemplo necessário de mencionar é a atual uberização feminina do Only Fans, rede social onde mulheres vendem pornografia feita de si mesmas, resultado da pornificação da cultura, e os crescentes sites onde mulheres se empregam como camgirls para fazer face a precarização ainda mais agressiva das mulheres no contexto de pandemia.

Estas mulheres ingressam no violento — psicologicamente e fisicamente — mercado do sexo, comprando a propaganda de que serão “trabalhadoras sexuais” — o novo “colaborador” da empresa ou semelhante ao discurso de “empreendedorismo” de aplicativos como Ifood e Uber — em um trabalho de riscos de exposição e assédio, enquanto que pornógrafos donos dos sites enriquecem cada vez mais e ficam com direitos sobre sua imagem, se é que estas não são vazadas por hackers e vendidas por terceiros.

Para criar o ambiente necessário a este comércio, é criado o discurso de que é liberador, autonomista e afirmação da sua sexualidade o auto-emprego na pornografia. Mas basta um passeio no mundo da pornografia para constatar que a sexualidade que performam não é delas, é dos homens, o corpo que devem portar é o corpo magro e feminilizado, tendo que vestir a erotização perversa que homens possuem da humilhação feminina. Tudo isso vem aumentando problemas entre as “sex workers” de transtornos da imagem corporal, compulsão por cirurgias plásticas, transtornos alimentares, quando não prejudicam um momento da vida onde poderiam estar direcionando suas carreiras. Afinal este é um “trabalho” que durará talvez até os 30 anos, dado o modelo estético pedofílico da sexualidade masculina. Uma jovem ingressando no mercado aos 18 como costuma ser, recrutada por outras mulheres neles, por homens fotográfos de “nus artísticos”, num contexto proxeneta chic e num ambiente de culto ligado ao libfem (feminismo liberal) que favorece o negacionismo da situação de exploração sexual, o pintando de empoderamento.

As candidatas serão jovens vulnerabilizadas por questões de negritude, pobreza e precarização trabalhista, histórico de abusos infantis, falta de apoio e estrutura familiar, auto-estima baixa por falas gordofóbicas na infância. Essa jovem não pode prever se chegando aos 30 não teria outro pensamento sobre essa “carreira”, e até lá dedicou seus esforços e tempo na indústria do sexo, prejudicando opções trabalhistas alternativas futuras.

Enquanto isso, fotógrafos e pornógrafos, produtores pornôs, por fim, os homens, não são afetados em nada por seu envolvimento no mercado pornô como são mulheres, não são afetados com o envelhecimento físico, com questões estéticas, e sequer ficam com o estigma misógino que recai sobre mulheres que entram com seus corpos na pornografia ou prostituição, julgadas interesseiras ou vagabundas que buscam “vida fácil”, vazias e descredibilizadas profissionalmente por este envolvimento no mercado do sexo, pois isso acaba se tornando público uma hora ou outra.

Rita Caddillac anuncia sua entrada para a rede social “Only Fans” de pornografia “faça você mesma”. A plataforma tornou mais aceitável a pornografia e seu consumo com o pretexto que todas pessoas estão ali com seu consentimento e porque “gostam”, mas a realidade é que mulheres encontraram na rede uma opção de renda frente a austeridade econômica, dentro de uma situação de exploração sexual por parte do primeiro mundo (países desenvolvidos) sobre mulheres do terceiro (países em desenvolvimento), que recebem em dólares por suas fotos postadas por seguidores de países ricos. Isso demonstra uma face do neocolonialismo contemporâneo em sua expressão sexista. Todos problemas de saúde mental gerados por redes sociais como auto-imagem, estresse de necessidade de engajamento e ansiedade são ampliados dentro da demanda de postagens pornográficas constantes por estas mulheres, que precisam ser cada vez mais inventivas em excitar homens, num mercado competitivo onde mulheres mais jovens ingressam todos os dias. Fonte: Folha de São Paulo.

Portanto temos um cenário onde por um lado temos mulheres reféns da disforia, com descontentamento crônico com seus corpos sexuados diante da pornificação cultural que imprime forte significado de objetificação ao fato de portar o corpo feminino, mulheres destransicionando em processos difíceis de desintoxicação de toda medicalização prévia de seus corpos femininos e, por outro lado, vemos homens fetichistas tendo suas fixações sexuais relacionadas a gênero cada vez mais apoiadas a despeito do bem-estar das mulheres. Incluindo o desrespeito de bandeiras clássicas do feminismo como o “não é não”, o consentimento sexual, transformando o não aceder a sexo com lésbicas em um caso de discriminação: “lésbicas que não gostam de pênis são transfóbicas”. Assim temos que até mesmo a nossa existência lésbica é convertida em criminosa por não aceitarmos pênis no nosso desejo erótico. Isso, como tudo no mundo cíclico que vivemos, tem um outro lado da moeda. Conforme a comunidade GBT+ e a sociedade vai se abrindo e abraçando esses absurdos, fêmeas humanas rebeldes e lesbo/sáficas seguem abrindo os olhos e percebendo o que está acontecendo através das consequências muitas vezes deixadas em seus corpos.

Homens seguem sendo homens, independente dos trajes. A mudança da casta na qual nasceram não ocorre por auto identificação de gênero. O gigantesco mercado do sexo, prostituição, a importância do tráfico sexual na economia global, o negócio bilionário da pornografia, as milhares de denúncias de estupro pelos movimentos Me Too no mundo, o fato de todas nós conhecermos alguém que foi estuprada ou abusada na infância, se não fomos nós mesmas, somente provam que homens infelizmente são hoje, predadores sexuais. Pois moldar meninos em futuros predadores sexuais é também intuito e tarefa da pornografia, para criar futuros clientes e dada a demanda da produção em massa de subjetividades masculinas necessárias a sustentação do Patriarcado-Capitalismo. A sexualidade da classe homem é moldada no ódio a mulheres, no desprezo a mulheres, pela pornografia e prostituição. Sem clientes, sem homens, a exploração sexual não existiria. O uso sexual de pessoas e seres vivos é sua demonstração de poder sobre a vida, é parte da necrofilia masculinista. As “novas masculinidades” não são sinal de que “homens estão mudando”, pois a pornografia somente cresce, se expande e banaliza. E junto aos benefícios recebidos da sua casta e socialização, formatam a mente masculina num processo social de psicopatização, que os incapacita à empatia por mulheres, crianças, animais e a vida ecológica. Essa psicologia masculina da qual mulheres se queixam sobre a frieza afetiva, distância e egoísmo, que nunca assumem um relacionamento, que fazem ghosting descartando mulheres, cria a tragédia de seres humanos que se tornam amputados relacionais e narcisistas normalizado. É infelizmente essa miséria subjetiva masculina que sustenta a economia misógina de exploração sexual no qual toda nossa cultura pornificada está baseada, pois para que mulheres se tornam produtos é preciso primeiramente desumanizá-las.

Mulheres foram tornadas capital sexual e reprodutivo, fontes rentáveis inesgotáveis, desde a Antiguidade, por um processo histórico de outrificação e menosprezo da sua existência. O libfem e o queer hoje recicla o Patriarcado e o moderniza, mantendo ideologicamente esse mercado do sexo em que se baseia nossa sociedade, e do qual a feminilização funciona como aliciamento desde a infância. A transição de “gênero”, ou melhor, a adoção de estereótipos sexuais femininos, não santifica de forma mágica homens de sua responsabilidade pelas atrocidades cometidas pela sua classe e muito menos de seus privilégios. Transfemininos que se declaram lésbicas demandando o acesso sexual aos corpos destas sob ameaça de declará-las “transfóbicas” não pode ser descolado da cultura de predação sexual e da prerrogativa sexual masculina onde homens tem moldada sua subjetividade.

As mulheres sem conformidade de gênero têm cara: são em sua maioria mulheres caminhoneiras, lésbicas, da periferia, negras e precarizadas, vítimas de abordagens policiais onde são revistadas por homens e de espancamentos incapacitantes como o caso de Thaylanne de Goiania.

Embora este texto se dirija a todas mulheres e especialmente mulheres desfem, precisamos dizer algo sobre a face lésbica geralmente associada à existência das mulheres desfeminilizadas, pois não importando a “orientação sexual”, a agressão patriarcal à desfems possui afinal um caráter lesbomisógino. Portar a tal “cara de lésbica”, conceito popular que muitas mulheres heterossexuais e lésbicas feminilizadas acham tão ofensivo, na verdade é apenas a constatação pelo senso comum de que a lesbiandade é historicamente relacionada com a desobediência de uma mulher com a obrigação de casta sexual. A relação constante entre desfeminilização e lesbiandade evidencia que heterossexualidade e feminilização andam juntas e são indissociáveis, uma vez que feminilidade são conjuntos de signos desenhados e pensados por homens para sinalizar a mulher como diferente deles e subjugada a eles, portados para garantir o cumprimento de um mandato: o da acessibilidade sexual da classe, a cooperação com a norma masculina, a fidelidade a homens, para não sofrer violência destes, não ser vista como uma perigosa “sapatona”. No fim a violência que sofrem mulheres caminhoneiras vem por visivelmente darem a mensagem de rechaço à disponibilidade sexual à homens. E o resultado extremo dessa violência são os lesbocídios, que alvejam em sua maioria mulheres lésbicas desfeminilizadas.

Na linguagem da indústria da moda, mulheres são retratadas como se estivessem mortas e prontas para serem devoradas sexualmente. Acima Billie Eilish, 19, em ensaio fotográfico para a Vogue. Fonte: instagram da cantora.

O rito de passagem da feminilidade, como foi descrito por Bev Jo, significa uma deslealdade e traição do seu eu menina. As mulheres na indústria pop assim que completam maioridade hoje, como no caso de Billie Eilish, 19 anos, também outros casos como Emma Watson, Millie Bobbie Brown, Miley Cyrus, Sandy, precisam declarar ao mundo que são mulheres adultas agora. O que significa passar a mensagem de que são fodíveis por homens, e portanto, heterossexualizadas e aptas a rituais sexuais com o sexo oposto, vestindo-se e portando-se de acordo com o olhar deles, pensando-se a partir do olhar deles. Esta mensagem também é lesbomisógina, pois assim, ao declarar lealdade aos homens e a traição de quem eram previamente — meninas livres do gênero — elas se retiram covardemente da possibilidade de sofrer o ostracismo de serem lidas como lésbicas. Por outro lado, as que são lésbicas influenciadas por um pensamento liberal, ou sob pressões familiares e sociais, ou que não desenvolveram seu orgulho sapatão, precisam dizer que embora sejam lésbicas, ainda são aptas ao olhar masculino e não são tão desobedientes, portanto sendo respeitáveis e decentes devido ao seu cumprimento das normas sexistas que as conformam no gênero. Sendo admissíveis numa entrevista de emprego portanto.

O corpo de Billie Eilish foi assediado e perseguido por paparazzos até que por fim expuseram seu corpo a despeito da forma como tentava defender este da opinião pública. Essas pressões acreditamos que resultaram em realizar o ensaio fotográfico como quem finalmente dava o que queriam para ser deixada em paz.

A representação do ser mulher está cada vez se tornando indissociável do ser fodível e objeto. Neste cenário, não há construção de “feminilidades” alternativas. Se uns anos atrás anorexia era o sintoma coletivo de meninas que não queriam crescer e ganhar um corpo com curvas e reprodutivo, deixando de menstruar e ganhar corpo pela abstenção do comer, o mal-estar feminino desta geração é a disforia, pois quem quer possuir um corpo cujo significado é a limitação da liberdade e a sua degradação e invasividade pela sexualidade masculina? Possuir seios, buceta, menstruar, é tornado um fardo. Não possuir a apresentação masculina, barba, e a potência muscular deste corpo, é novamente tratado como inferioridade e uma miséria, uma sina, o “sexo frágil”. A mensagem que Billie Eilish acabou transmitindo a jovens com suas fotos sensuais, as fotos que alcançaram milhões de likes em menor tempo da história do instagram, após longa pressão e questionamentos constantes sobre por que ela se vestia com roupas largas, por que ela escondia seu corpo, por que ela não se sensualizava, cedendo afinal à essas pressões, é de que: se você nasceu do sexo feminino e não é fodível (pois tal destino estaria escrito nesse sexo), você é trans. Ou seja, o sexo feminino é definido pelo constructo da feminilidade, pois se você não performa a objetificação e desumanização contidos na feminilidade, você é trans, ou seja nasceu no corpo errado e deveria pertencer ao sexo oposto, pois tais qualidades como gostar de roupas confortáveis e assertividade, desejo de desenvolver força física, etc, seriam propriedades da masculinidade/dos homens.

Billie Eilish antes, em trajes confortáveis.

Assim, homens conseguem lançar seu ditame final sobre o que somos e impôr sua significação (gênero) sobre nosso sexo como absoluta: existimos para gratificação deles, ou não existimos. Nosso corpo será sempre um convite ao assédio e somente a transição de gênero poderá nos libertar deste fardo. Por isso mesmo Elliot Page em entrevista se gaba de como é bom poder amarrar a toalha na cintura após o banho, não precisando se preocupar em esconder os seios pois realizou a mastectomia, hoje sonho de consumo de muitas. Por que temos o estresse constante que homens não tem com a possível exposição do nosso corpo? Porque vivemos sob medo constante do estupro.

Homens (nascidos no sexo masculino) andando sem camisa estão exibindo seu status de classe não estuprável. Estão demonstrando seu grande orgulho de pertencer a classe que é livre por nascimento. Enquanto isso temos que esconder nossos seios, mesmo em caso de amamentação em público onde muitas mulheres são censuradas ou punidas, afinal nossos seios estão imensamente pornificados, sendo a exibição deles sendo lido como um convite ao assédio e ao estupro. O transgenerismo feminino (FTM) não contribui para desvencilhar os seios da sexualização.

E assim a classe masculina termina de nos desaparecer, num processo de extinção simbólica das lésbicas e mulheres desfem (desfeminilizadas), minando também nosso direito de habitar nossas corpas em paz, com direito a saúde e integridade física. Pois parece que a punição é ter que atravessar todo seu sistema médico para poder existir de outra forma e ter sua expectativa de vida reduzida como foi o caso do trans FtM João Nery, que faleceu também decorrência de complicações nos órgãos por anos sendo a primeira cobaia da medicina trans no país, pois dificultou fazer frente ao câncer.

A lésbica é mais do que sexualidade, é resistência feminina. É desobediência e inconformidade com o sistema de gênero. Por isso muitas lésbicas não são feminilizadas. Por isso, caminhoneiras são sempre a imagem universal das lésbicas, pela sua visibilidade espontânea e estridente de alguém independente da expectativa masculina. E por isso, “cara de lésbica “ é sobre o alvo dos homens e sua violência masculina, é sobre ser alvo e estar mais vulnerável a violência lesbocida. Porque essas mulheres são a linha de frente, elas bancam com suas vidas, para que você, todas mulheres, se desobriguem da feminilidade. É justo deixar elas tomarem porrada sozinhas? Devemos questionar o quanto o apego ferrenho de muitas feministas a rituais de beleza e a aparência feminilizada pode ser expressão de uma lesbomisoginia, um medo da leitura enquanto lésbica ligada à desfeminilização.

Porque as nossas estão tomando porrada na linha de frente para sermos livres. Não é justo que tomem porrada sozinhas. Que tal ir pra lá e dividir as porradas com elas e construir uma grande linha de frente que deixe o inimigo sem forças?

Nós só vamos ter um futuro livre de gênero, onde meninas cresçam sem disforia, sem ódio a seus corpos femininos, sem achar que nossos corpos são inferiores ou piores, falhados, um estorvo, onde possam se orgulhar do seu sexo, se tivermos grande visibilidade de mulheres fora do padrão sexista (fora da feminilidade). Está em nossas mãos construir esse futuro onde a existência lésbica e feminina (mulher) não seja mais eliminada e declarada impossível. Precisaremos do compromisso de toda mulher consciente, toda feminista, em aderir a desfeminilização sempre que possível para solidarizar-nos com toda mulher que luta diariamente para existir da forma como ela é. E para rejeitarmos coletivamente o olhar fetichista masculino sobre nós, defendendo nossa humanidade, deixando finalmente nítido que mulher não é o equivalente de feminilidade.

Fala em protesto de feministas coreanas contra as spycams. Retirando-se da feminilidade, mulheres coreanas se retiram da servidão sexual feminina e buscam sua liberdade. Fonte: youtube.

Referências e Fontes:

Negra, lésbica, periférica: morte de Luana Barbosa faz 5 anos sem resolução. Em :https://www.uol.com.br/universa/noticias/redacao/2021/04/13/negra-lesbica-periferica-morte-de-luana-barbosa-faz-5-anos-sem-resolucao.htm

Radical feminism paves the way for a resurgent South Korean women’s movement. Jihye Kuk, Hyejung Park, and Caroline Norma https://www.feministcurrent.com/2018/11/07/radical-feminism-paves-way-resurgent-south-korean-womens-movement/

4o Protesto contra Spycam — Coréia do Sul. Em: https://www.youtube.com/watch?v=XiqsMueWFFg&t=2s

Feminismo Lésbico e Movimento Gay: Outra Supremacia Masculina, mais um Separatismo — Marilyn Frye. Em: https://medium.com/r/?url=https%3A%2F%2Fheresialesbica.noblogs.org%2Fpost%2F2014%2F08%2F20%2Ffeminismo-lesbico-e-o-movimento-de-direitos-dos-gays-outra-visao-da-supremacia-masculina-outro-separatismo-marilyn-frye%2F

Filhos de Paulo Gustavo e Thales Bretas nasceram nos Estados Unidos. Em: https://www.purepeople.com.br/midia/filhos-de-paulo-gustavo-e-thales-bretas_m3514047

Manifiesto de la Plataforma Estatal LGTB por la Regulación de la Gestación Subrogada: https://static.eldiario.es/eldiario/public/content/file/original/2016/0522/23/manifiesto-plataforma-x-la-gs-lgtb-0a9c198.pdf

“Against the “Feminine Essence” . Doutora Jane Robbis: https://www.thepublicdiscourse.com/author/jane-robbins/

“Laerte tira a roupa para a Rolling Stone Brasil”. Revista Rolling Stone, 2013. https://rollingstone.uol.com.br/noticia/laerte-tira-roupa-para-irolling-stone-brasili/ (vale lembrar que como homens não tem a experiência fenomenológica de sentir seu corpo como em constante risco, eles não se sentem abusados ou expostos em exibir o corpo, sendo o exibicionismo geralmente uma atitude de ameaça de estupro ou simplesmente irrelevante para eles).

Provocações — Entrevista com Cartunista Laerte. Em: https://tvcultura.com.br/videos/12922_provocacoes-entrevista-o-cartunista-laerte-coutinho-bloco-03.html

Vivendo em uma cultura pornificada”. Gail Dines e Alex Doherty. Publicado em New Left Project. Tradução em: https://solemgemeos.medium.com/vivendo-em-uma-cultura-pornificada-5b6e9a8ca4ae

“O Conceito Trans em Meio a Nebulosa da Sexualidade”. Larissa Santana Cavalcante. http://dspace.bc.uepb.edu.br/jspui/bitstream/123456789/4218/1/PDF%20-%20Larissa%20Santana%20Cavalcante.pdf

“Depois de crescer com ‘soft porn’, OnlyFans adota regras mais rígidas para conteúdo sexual”. Folha de São Paulo: https://redir.folha.com.br/redir/online/emcimadahora/rss091/*https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2021/04/onlyfans-cresce-e-adota-regras-mais-rigidas-para-conteudo-adulto.shtml

Cotton Ceilling (Teto de Algodão) — por Sam Berg: https://www.youtube.com/watch?v=mccfWsL5218&feature=emb_title

Lerner, Gerda. A criação do patriarcado: história da opressão das mulheres pelos homens. São Paulo: Cultrix, 2019.

My History. Keira Bell. Em: https://www.persuasion.community/p/keira-bell-my-story

Introdução de Dykes Loving Dykes. Por Bev Jo, Linda Strega e Ruston: https://medium.com/@lesbica/introdu%C3%A7%C3%A3o-de-dykes-loving-dykes-por-bev-jo-linda-strega-e-ruston-81d1905f7caf

MIGUEL, Ana de. Neoliberalismo sexual: el mito de la libre elección. Madrid: Ediciones Cátedra/Universidad de Valencia, 2016.

“Billie Eilish afirma usar roupas largas para não ser julgada pelo seu corpo”. https://www.uol.com.br/universa/noticias/redacao/2019/05/13/billie-eilish-afirma-usar-roupas-largas-para-nao-ser-julgada-pelo-seu-corpo.htm

“Nova era! Billie Eilish posa de lingerie e abandona roupas largas”. Em: https://capricho.abril.com.br/moda/nova-era-billie-eilish-posa-de-lingerie-abandona-roupas-largas/

PERES, Milena Cristina Carneiro; SOARES, Suane Felippe; DIAS, Maria Clara. DOSSIÊ SOBRE LESBOCÍDIO NO BRASIL. De 2014 até 2017. Pg. 32. Autoral Editora, Brasil: 2018. Site: https://www.lesbocidio.com/.

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Memória Lésbica

O legado sapatão não será apagado: conteúdo lesbofeminista que busca retomar as raízes rebeldes do movimento de lésbicas.